Tudo tem fim.
Texto retirado de "amore de todas as cores"
Fotografia meramente ilustrativa.
O olhar dela não era o mesmo. O que ela via também não era igual. Os sentimentos tinham desvanecido: desaparecido até: alguns. Ele, no fundo, também sabia que ela estava diferente. Mas nem ele, nem ela queriam acreditar que o amor tinha desaparecido. Ela sabia que tinha de falar, de tomar as rédeas naquele momento - como sempre fez ao longo daquele relacionamento, mas não era fácil. Olhava-o com carinho. Sentia que ele tinha crescido muito enquanto homem e enquanto ser humano e ela estava feliz por ele, Gostava verdadeiramente dele. Mas algo os tinha feito caminharem juntos - mas em estradas paralelas. Ela era o Senhora romântica, ele o senhor realista. E apesar de Romance e Realidade caminharem a par, nunca verdadeiramente se encontram. E, naquele dia ela sabia que eles tinham de seguir cada um o seu caminho. Pois o amor não vive sem o romance, e o romance não existe sem amor. Aquelas coisinhas que foram esquecidas, os dias em que não fizeram amor, as mensagens não respondidas, as surpresas inexistentes, aquele bilhetinho que nunca chegou, os aniversários esquecidos e muitas pequenas coisas sobre as quais o amor é construído, alimentado, enlouquecido. Maria sentiu um frio ao pensar em todas as pequenas desilusões, pequenas tristezas que foi acumulando até este momento: não ama mais. Já não consegue mais. Olha-o nos olhos e diz-lhe que têm de conversar. Num tom de voz baixo, desgastado pelo tempo, pelas tentativas infrutíferas de tentar fazer-lo entender que essas pequenas coisas são muito importantes começa a dizer lhe que perdeu o rumo do amor; que, por muito que tenha tentado viver sem essas pequenas coisas tão importantes, elas eram tão necessárias ao amor como o ar que respiramos. Deu-lhe imensos exemplos. Ele olhava-a com dor - por sentir que ela já não o amava - por saber que ele nunca tinha feito um esforço para ser romântico. Achava desnecessário. No meio de toda uma conversa de murmúrios, nem ele, nem ela queriam dizer adeus, mas era um Adeus que estava a acontecer. A comida esfriou, o vinho aqueceu no copo. As bocas secas de tanta tensão. A vida deles passava-lhes pela frente. Na cabeça dela a tristeza por nunca ter tido as pequenas coisas que, de tão importantes, tomaram as rédeas à falência de um amor que sentira um dia ser: para sempre. Ele pensava no dia em que percebeu que ela ficou encantada com o pedido de casamento da amiga, mas nunca foi capaz de a pedir- mesmo com o tanto que a amava. As x em que via a desilusão estampada na cara dela depois de mais um esquecimento: da falta de um detalhe. E pensava, com as lágrimas a escorrerem pela cara. Era tão pouco e ele de tão grande pensar, esqueceu-se que o pouco é que faz o muito. E não há muito sem pouco. Não queria perder o amor daquela mulher, mas via nos seus olhos carinho, mas não desejo, não paixão, não amor. Ela sentia a tristeza invadir o seu peito a cada palavra que proferia - mas sabia que tinha tentado de tudo para lhe dizer, explicar o que é preciso num amor. O caminho do amor é o caminho de pequenas migalhas multiplicadas por milhões. Ela não queria grandiosidades. Ela queria detalhes. A conversa terminou sem ele conseguir proferir uma palavra. Mais uma vez estava a deixar passar o momento sem conseguir mudar o rumo - pensava ela. Ela conhecia-o. Sabia que quando falasse não havia como voltar atrás. Ele nunca iria lutar por ela: mesmo que a amasse. Ele queria falar, mas anos de contenção racional não lhe permitiam tal coisa. E assim foi. Ela acabou de falar. Sairam do restaurante sem uma palavra, apesar de tantas que pairavam na mente deles. Ela sempre falava quando se chateavam. Ele nunca conseguiu faze-lo. E neste momento em que ela jamais falaria - ele também não fez e assim seguiram em estradas paralelas da vida: ela continuou o seu caminho pelo trilho do romance, ele caminha até hoje um pouco perdido pelo trilho da racionalidade - embora hoje já não tão cheio das suas certezas anti - romance.